No dia 31 de março de 2017 foi publicada a Lei nº. 13.429, que além de alterar dispositivos da Lei nº. 6.019/74 que versa sobre o trabalho temporário nas empresas urbanas, dispõe sobre as relações de trabalho na empresa de prestação de serviços a terceiros.
De acordo com o que foi divulgado amplamente por todos os meios de comunicação, a Lei nº. 13.429 teria autorizado a terceirização da atividade-fim pela empresa tomadora do serviço (contratante), o que gerou grande expectativa para todos os setores da economia, incluindo as empresas de telecomunicações que terceirizam por exemplo, os serviços de call center, cobrança, instalação e manutenção de infraestrutura de rede e equipamentos junto ao cliente final (e outros).
Cumpre destacar que o artigo 94, inciso II da Lei Geral de Telecomunicações – LGT (Lei nº. 9.472/97) autoriza a terceirização pelas empresas de telecomunicações de sua atividade-fim (inerentes) e atividade-meio (acessórias ou complementares). Senão vejamos:
“Art. 94. No cumprimento de seus deveres, a concessionária poderá, observadas as condições e limites estabelecidos pela Agência:
(…)
II – contratar com terceiros o desenvolvimento de atividades inerentes, acessórias ou complementares ao serviço, bem como a implementação de projetos associados.
Até a publicação no dia 31/03/2017, da Lei nº. 13.429, inexistia no país regulamentação expressa versando sobre a prestação de serviços terceirizados. A margem de norma sobre o tema, o Tribunal Superior do Trabalho – TST editou a Súmula nº. 331 do TST. A mencionada Súmula estabelece que a contratação de trabalhadores por empresa interposta é ilegal, formando o vínculo diretamente como o tomador dos serviços (contratante), salvo nos casos de trabalho temporário (Lei nº. 6.019/74), serviços de vigilância (Lei nº. 7.102/83), serviços de conservação e limpeza, bem como a de serviços especializados ligados à atividade-meio do tomador, desde que inexistente a pessoalidade e subordinação direta do empregado junto a tomadora do serviço.
Assim sendo, a Súmula nº. 331 do TST deixou margem ao interprete para definir as hipóteses de terceirização consideradas lícitas, ou seja, aquelas relacionadas a atividade-meio (secundária) do tomador do serviço, ou ilícitas, quando relacionadas a atividade-fim (principal) do tomador do serviço.
Não obstante a previsão na LGT autorizando a terceirização da atividade-fim pelas empresas de telecomunicações, o TST em jurisprudência majoritária tem negado vigência ao disposto no artigo 94, inciso II da LGT, e com base na Súmula 331 do TST, tem considerado ilícita a terceirização das atividades de instalação e manutenção da infraestrutura necessária para viabilizar a prestação dos serviços de telecomunicações pelas empresas do setor, e via de consequência tem reconhecido o vínculo trabalhista do empregado diretamente junto a tomadora do serviço. Veja abaixo a título de exemplificação jurisprudência do TST:
“(…) B) RECURSOS DE REVISTA INTERPOSTOS PELAS RECLAMADAS – ANÁLISE CONJUNTA. VÍNCULO EMPREGATÍCIO. ILICITUDE DA TERCEIRIZAÇÃO. EMPRESA DE TELECOMUNICAÇÕES. INSTALAÇÃO E MANUTENÇÃO DE LINHAS TELEFÔNICAS. ATIVIDADE FIM. A jurisprudência desta Corte Superior adota entendimento de que as atividades de instalação e manutenção de linhas telefônicas e operação de redes de acessos, cabos ópticos, serviço de comunicação de dados e serviço ADSL são consideradas atividades fim das empresas concessionárias dos serviços de telecomunicações, desautorizando a prática da terceirização. Ressalva de entendimento desta Relatora. Recurso de revista não conhecido”. (TST. ARR – 227-03.2014.5.17.0001, Relatora Ministra: Dora Maria da Costa, Data de Julgamento: 15/06/2016, 8ª Turma, Data de Publicação: DEJT 17/06/2016)
Pois bem!
A Lei nº. 13.429 ao dispor sobre as relações de trabalho na empresa de prestação de serviços a terceiros prevê o seguinte:
“Art. 4º-A. Empresa prestadora de serviços a terceiros é a pessoa jurídica de direito privado destinada a prestar à contratante serviços determinados e específicos.
- 1o A empresa prestadora de serviços contrata, remunera e dirige o trabalho realizado por seus trabalhadores, ou subcontrata outras empresas para realização desses serviços.
- 2o Não se configura vínculo empregatício entre os trabalhadores, ou sócios das empresas prestadoras de serviços, qualquer que seja o seu ramo, e a empresa contratante.”
Outrossim, a Lei nº. 13.429 não definiu em que consiste “serviços determinados e específicos”, deixando margem novamente para os Tribunais interpretarem, se os serviços determinados e específicos abrangeriam ou não a atividade-fim da empresa tomadora dos serviço.
Entre os argumentos para fundamentar que a Lei nº. 13.429/2017 não permitiu a terceirização da atividade-fim da tomadora do serviço, está o fato de que a contratação de empresa interposta (terceirização) em regra é ilegal e deve ser prevista de forma expressa na Lei nº. 13.429/2017 ao prever que a terceirização incide sobre serviços determinados e específicos se espelhou na modalidade de contrato de trabalho por prazo determinado previsto no artigo 443, §1º da CLT.
Em outros termos, a intenção da Lei nº. 13.429/2017 foi a de autorizar a terceirização de atividade-fim apenas para hipótese de trabalho temporário, tanto é que o próprio artigo 9º, §3º foi expresso ao dispor que “o contrato de trabalho temporário pode versar sobre o desenvolvimento de atividades-meio e atividades-fim a serem executadas na empresa tomadora de serviços.”, não tendo nenhum dispositivo expresso neste sentido com relação aos serviços terceirizados.
E mais, a Lei nº. 13.429 estabelece no artigo 4º, §§ 1o e 2o que os requisitos da relação trabalhista do empregado se dá junto a empresa prestadora dos serviços terceirizados, não configurando vinculo entre o empregado e o tomador do serviço. Outrossim, caso os Tribunais de fato interpretem que a Lei nº. 13.429 não autorizou a terceirização da atividade-fim, será reconhecido o vínculo trabalhista do empregado terceirizado diretamente com a tomadora do serviço (contratante).
Pelo exposto, recomenda-se cautela as empresas de telecomunicações com relação a terceirização de parte de suas atividades, seja pela necessidade de interpretação pelos Tribunais da abrangência da definição de “serviços determinados e específicos” previsto na Lei nº. 13.429, seja pela jurisprudência majoritária do TST considerar com base na Súmula 331, ilícita a terceirização de atividades de instalação e manutenção de infraestrutura por considera-las atividade-fim das empresas de telecomunicações.
De toda sorte, caso as empresas de telecomunicações optem por terceirizar as atividades de instalação e manutenção de infraestrutura, deverão elaborar contrato escrito prevendo serviço especifico, determinar o objeto da terceirização, o prazo para a execução do serviço, respectivo valor e local da prestação dos serviços, e adotar outras certas precauções. Tudo isso visando afastar o reconhecimento da terceirização ilícita, e sobretudo a configuração da subordinação e pessoalidade do empregado junto a tomadora do serviços.
Drª. Jordana Magalhães Ribeiro é advogada, consultora jurídica e Sócia da Silva Vitor, Faria & Ribeiro Advogados Associadas.