Parece arrogância ou até mesmo utopia pensar em uma solução para o caos existentes nos postes em nossas cidades e que seja ainda por cima uma solução definitiva e perene, onde o caos não aumente e, ao contrário, a organização seja cada vez melhor e mais eficaz.
Algumas coisas precisam piorar para que melhorem, e infelizmente esse foi o caso do compartilhamento de postes.
Quando as empresas de SCM ainda não usavam postes e apenas as concessionárias de telefonia faziam esse uso, amparadas em contratos herdados da época da telefonia estatal e onde a distribuição de energia também era estatal, existia uma certa paz nos postes, as concessionarias pagavam alguns centavos por poste e pelo seu lado as distribuidoras faziam vistas grossas, não pediam projeto, não fiscalizavam, apenas se preocupavam em receber o valor pago pelas teles.
Isso mudou drasticamente quando as SCM começaram a usar os postes, quando esse “bando de chatos” começou a pedir espaço nos postes, qual foi a primeira política da maioria das empresas distribuidoras de energia, criar barreiras de entrada, cobrando valores extorsivos.
E quanto à fiscalização, continuaram sem fazer nada, deixando que começasse o caos.
Com a Resolução Conjunta nº4, a coisa piorou muito, pois como estabeleceram um preço de referência e algumas centenas de empresas entraram com solicitação de adequação do valor, a política mudou para exigências mais exageradas nos projetos, dificuldades extras de aprovação e continuaram cobrando o que bem entendiam dos ocupantes.
Com isto chegamos ao caos atual, onde outros atores passaram a entrar no assunto, tais como Procons, Procuradorias e Justiça.
Agravando todo esse contexto, as distribuidoras de energia não têm a expertise necessária para gerenciar o uso pelo setor de telecomunicações, não têm equipes dimensionadas nem para análise dos projetos em tempos razoáveis, não têm bancos de dados atualizados com georreferenciamento dos postes e seus ocupantes e muito menos equipes preparadas para uma fiscalização efetiva.
Outro agravante é que a Anatel e Aneel estimam em mais de R$ 20 bilhões o custo de regularização das redes nos 10 milhões de postes mais críticos.
Além disso tudo, os valores que as distribuidoras de energia recebem, vão em grande parte para a modicidade tarifaria, o que em tese deixa desinteressante ter tanto trabalho por tão “pouco” dinheiro, segundo declarações delas mesmas.
Nas duas consultas públicas recentemente encerradas, as propostas das agências reguladoras simplesmente se limitaram a regular mais do mesmo, criando novas regras sobre algo que intrinsecamente não está funcionando.
Portanto, mais regras no mesmo sentido das que já existem hoje na Resolução Conjunta em vigor apenas agravará o problema. Pensando nisso tudo, a Abrint, acompanhada de outras associações do setor de telecomunicações e de engenharia, se reuniu por diversas vezes, e todos chegaram a um consenso de solução que tem a real possibilidade de funcionar, mas vai exigir coragem e, principalmente, uma visão holística desse problema.
A solução passa por diversos caminhos, o primeiro deles e o mais importante é que a faixa de utilização das telecomunicações nos postes, os famosos 50 cm que temos disponíveis, passariam a ser de gerenciamento exclusivo do setor de telecomunicações.
Esse gerenciamento ficaria a cargo de uma entidade sem fins lucrativos, que seria a Gestora Nacional de Infraestrutura. Ela passaria a ser a responsável por todos os espaços de compartilhamento nos postes em nível nacional e receberia dos ocupantes o valor que hoje é desperdiçado sendo pago às empresas de energia.
Será definido um valor teto, que seria equivalente num primeiro momento ao valor de referência atualizado; esse passaria de imediato a ser o valor máximo pago por qualquer ocupante que eventualmente pagasse mais do que isso. Os ocupantes que tiverem valores menores que esse valor teto por questões contratuais, continuariam pagando o mesmo valor por um período longo que ainda seria definido.
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Essa entidade Gestora Nacional de Infraestrutura estaria subordinada a um Grupo de Coordenação da Gestão de Infraestrutura (GCGI), esse grupo seria presidido pela Anatel e teria em sua composição a Aneel, MCOM, MME, e as Associações representativas dos setores de telecomunicações e de energia.
Essa GCGI é que definirá preços, procedimentos, prazos de regularização, aprovação de projetos de ocupação e terá a responsabilidade legal sobre a faixa de compartilhamento.
A Gestora Nacional contratará empresas com a função de serem Zeladoras Técnicas de áreas geográficas. Essas empresas serão a mão de obra envolvida nas fiscalizações, levantamento e manutenção de informações sobre as ocupações, bem como em projetos de regularização conjunta.
Será foco da Gestora Nacional, manter nos postes quem se regularizar e pagar pelo uso o valor teto definido, existirão prazos para a regularização e, depois desses prazos, a ocupação irregular será prontamente identificada e solucionada.
Uma vez regularizado, não haverá mais espaço para utilização sem projeto ou clandestina. A fiscalização será intensa e com a colaboração dos próprios ocupantes legalizados.
Como a Gestora Nacional receberá os valores de aluguel dos pontos de fixação, o valor repassado às elétricas será apenas o custo incremental que elas têm por ter essa ocupação extra no poste, o que já foi levantado que fica na casa dos centavos por poste. Por outro lado, um custo incremental não é uma receita, e sim uma reposição de despesas, portanto não fica sujeito a modicidade tarifaria.
Nesse novo cenário qualquer problema nas redes de telecomunicações seria comunicado ao GCGI, que por ter toda a ocupação em banco de dados poderia interagir rapidamente com a Gestora Nacional e as Zeladorias Técnicas criando soluções muito rápidas e eficientes.
Esta proposta, que foi apresentada conjuntamente por diversas associações, tem como principal vantagem não precisar de dinheiro novo para corrigir a ocupação dos postes, pois o dinheiro atualmente desperdiçado sendo pago às distribuidoras de energia ficaria com a Gestora Nacional, que usaria esse dinheiro de forma efetiva e eficiente para a regularização muito rápida sem onerar ainda mais o consumidor ou as empresas de telecomunicações.
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Autor: Basílio Peres é Conselheiro da ABRINT, Presidente do LAC-ISP, membro do Comitê de Prestadoras de Pequeno Porte da ANATEL, Conselheiro Deliberativo do Atacado da ABR Telecom e Diretor de Operações em Provedor de Acesso à Internet.