Impactos da Lei Geral de Proteção de Dados - LGPD nas Relações Trabalhistas
Enviado em 24.08.2020

Impactos da Lei Geral de Proteção de Dados – LGPD nas Relações Trabalhistas

É certo que as empresas precisam iniciar o quanto antes as adequações à LGPD, pois ainda que prorrogada, em nenhum momento se discute sua revogação do ordenamento jurídico brasileiro.

Antes de discutir sobre o tema, é importante destacar que embora existam grandes esforços para prorrogação da entrada em vigor da Lei geral de Proteção de Dados – LGPD – inclusive tendo sido publicada a Medida Provisória 959/2020 que prorroga o prazo para maio/2021 e estando em discussão no Congresso Nacional o Projeto de Lei no 1179/2020 que a prorrogaria para Janeiro/2021 – é certo que as empresas precisam iniciar o quanto antes as adequações à LGPD, pois ainda que prorrogada, em nenhum momento se discute sua revogação do ordenamento jurídico brasileiro.

Ademais, a urgência em se adotar procedimentos que atendam às exigências legais contidas na LGPD é perfeitamente justificável, haja vista ser um trabalho minucioso, que consiste na análise de toda forma de tratamento de dados dentro do seu provedor, seja em meio digital, seja em meio físico (papel).

Assim, o provedor de internet terá que revisar e conhecer como se dá o processo de tratamento de dados, tanto de pessoas físicas externas (clientes, parceiros, prestadores de serviço, entre outros) como de pessoas internas (sócios, colaboradores, prepostos, entre outros). Ou seja, a empresa deverá analisar todo processo de coleta, armazenamento, compartilhamento e eliminação de dados pessoais de qualquer pessoa física, interna ou externa.

Dessa maneira, a análise do processo de tratamento de dados pessoais deverá ser construída dentro de cada departamento e em relação a qualquer dado pessoal que venha a ser coletado, um trabalho árduo e demorado, que nos leva a afirmar que mesmo que a LGPD seja prorrogada para 2021, ainda assim é um prazo curto para tantas adequações, sendo necessário correr contra o tempo nesse momento.

Essa matéria tem por objetivo apresentar alguns requisitos que deverão ser atendidos pelo seu provedor no que se refere às relações trabalhistas e LGPD, desde o momento do recebimento de currículos e entrevista de emprego até a contratação, bem como, durante toda a relação de trabalho, pois, embora a LGPD não seja especificamente direcionada ao Direito Trabalhista, ela tem abrangência geral e se aplica a qualquer hipótese de tratamento de dados pessoais.

Desse modo, em um primeiro momento a coleta de dados realizada pelo empregador tem por fundamento a aferição da capacidade profissional do candidato, porém o que se deve tomar cuidado é com a possibilidade de coleta de dados exorbitar essa finalidade legítima.

Esta preocupação se faz ainda maior quando no processo de candidatura para a vaga de emprego, mais especificamente com preenchimento de fichas de avaliação e entrevista. O que se recomenda é evitar a coleta de dados considerados sensíveis, como os relativos à vida sexual, filiação sindical, opinião política, crença religiosa entre outros.

Assim, o entrevistador deverá se limitar a coletar dados que sejam necessários para aferir a qualificação profissional do candidato ou que sejam indispensáveis para avaliação profissional e psicológica do candidato diante das funções que necessitarão ser executadas para aquela função específica.

A jurisprudência brasileira possui importante precedente nesse sentido, em que se entende, por exemplo, que a exigência de certidão de antecedentes criminais de candidato a emprego somente se justifica em razão de previsão em lei, da natureza do ofício ou do grau especial de fidúcia exigido. Nos demais casos, tal situação é ilegítima e caracteriza lesão moral.

Já na fase de contratação, cabe lembrar que o processamento de informações do empregado pelo empregador é resultado da subordinação intrínseca à relação de emprego, e, muitas vezes, indispensáveis para registro do empregado, pagamento salarial, concessão de benefícios, entre outras situações. Todavia, o que antes era, por exemplo, somente uma “Ficha de Registro” do Empregado, passa a ser, à luz da LGPD, um conjunto de “Dados Pessoais”, alguns deles, inclusive “Dados Pessoais Sensíveis”.

Ainda, toda vez que seu provedor coleta dados pessoais e repassa qualquer informação de um empregado que possibilite a identificação desse empregado para um terceiro, seja quem for esse terceiro, haverá uma transmissão de dados pessoais nos termos da lei. Isso envolve, por exemplo, convênios médicos, planos de saúde, vale-refeição, vales-alimentação, E-Social, consultorias contratadas, entre outros.

Dessa forma, sabendo do risco de uma multa que pode chegar a 2% do faturamento anual da empresa, os empregadores, diante dessa nova realidade, devem buscar se adequar da melhor maneira, o que envolve desenvolver novas rotinas e identificar a melhor base legal para basear e justificar o tratamento de dados.

Assim, será necessário analisar questões como:

 – A possibilidade ou não de aplicação do conceito de “legítimo interesse” pelo empregador, para efeito da dispensa de consentimento, nos termos do art 7º,IX, e 10 da LGPD.

 – Reestruturação de contratos de trabalho e demais termos para inclusão de cláusula de consentimento de tratamento de dados que não se enquadrem em legítimo interesse.

 – A possibilidade ou não de conservação de dados pessoais dos empregados, que não impliquem cumprimento de obrigações legais, após o seu desligamento, e especialmente se o empregado solicitar a eliminação desse dado (art 15, III, e 16 da LGPD).

Com relação a guarda de documentos trabalhistas, mesmo após a rescisão do contrato de trabalho, cabe esclarecer que a legislação e normas trabalhistas fixam prazos específicos que devem ser observados pelo empregador, o que precisa ser verificado caso a caso.

Por mim, conclui-se esta matéria com a recomendação de que o provedor de internet faça um mapeamento completo das informações-dados que transitam pela empresa, envolvendo todas as pessoas físicas (empregados, contratados, autônomos, empregados de contratadas, etc.), e busque a ajuda de um profissional, se necessário, para implantar práticas de compliance trabalhista e readequação de termos e contratos, a fim de minimizar riscos em relação as obrigações impostas pela LGPD.

Dra. Anna Gardemann Dra. Mariana Vidotti – Ambas compõem o corpo de Advogados da Gardemann & Vidotti Advogados Associados.

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