O Operador de Rede Neutra no Brasil: Desafios e Oportunidades
Enviado em 11.10.2021

O Operador de Rede Neutra no Brasil: Desafios e Oportunidades

Políticas de oferta, especialmente de incentivo à construção de infraestrutura de redes fixas de transporte de alta velocidade, ainda foram muito pouco exploradas […]

Políticas de oferta, especialmente de incentivo à construção de infraestrutura de redes fixas de transporte de alta velocidade, ainda foram muito pouco exploradas no Brasil. Basta olhar o histórico de contingenciamento de fundos setoriais de telecomunicações e os abundantes subsídios indiretos à expansão das redes de banda larga móvel oferecidos nos últimos anos. Sendo assim, temos uma oportunidade pela frente: vamos cuidar de buscar a melhor regulação, assegurando que os compromissos de construção de redes backbone e backhaul se encontrem com as redes interiorizadas dos provedores regionais, cujo crescimento é exponencial.

Uma das formas de se garantir isso seria um entrante operador neutro. E como avaliar a atual regulamentação e o edital do 5G sobre essa perspectiva específica?

A relevância dos atores de redes neutras é óbvia: o Brasil deve encontrar maneiras de otimizar redes, ao invés de duplicá-las e triplicá-las. Mas esse modelo deve conciliar um tripé complexo: sustentabilidade financeira para o seu operador, segurança regulatória e modelos criativos de negócios para os provedores regionais.

Para o primeiro item do tripé acima, resumidamente, as grandes operadoras buscam soluções relacionadas à reorganização estrutural de suas empresas, segregando as atividades de serviço, das atividades de infraestrutura. Para que haja viabilidade econômica, essa segregação poderia ser realizada através da alienação de uma unidade de negócios para se estruturar uma equity joint venture com investidores, traduzindo capilaridade de rede própria com força de investimento de parceiros financeiros, em especial, os fundos de investimentos. Uma nova roupagem para a clássica separação estrutural de ativos.

Para os dois demais itens, qualquer que seja o modelo adotado, devemos avaliar a seguinte premissa: enquanto o provedor regional focaria na oferta de serviços e na experiência do atendimento do cliente, o operador neutro focaria na expertise técnica e tecnológica e cuidaria da expansão e da manutenção da malha de fibra. Embora a rede própria seja sim, hoje, um diferencial competitivo, diante da comoditização do acesso e das dificuldades crescentes de compartilhamento de rede com as concessionárias elétricas, há vantagens a longo prazo na contratação de rede neutra.

Quando se avalia do ponto de vista do mercado (e não os operadores), o regulador entende que: incentivar mecanismos atrativos para operadores neutros implica em racionalização de investimentos, evitando-se redundância de infraestruturas em um mesmo local, bem como incremento de ofertas e competição de produtos e serviços para os clientes e, por outro lado, risco de concentração de infraestrutura por um único ou poucos operadores.

Já com relação às modelagens possíveis de negócio, trazendo à nossa realidade um pouco das experiências estrangeiras, esses operadores neutros costumam abordar os provedores de forma híbrida, tanto garantindo a infraestrutura física de fibra passiva, quanto o fornecimento de serviços de acesso ativo. Pode haver cenários em que se vislumbra a remodelagem de possibilidades de desagregação compartilhada de elementos de rede, como o bitstream, ou até mesmo modelagens de fatiamento dessa mesma rede como serviços.

De uma forma geral, quando se trata de redes neutras fixas (de fibra) ou de redes móveis para atendimento de operações de MVNOs. Não há tanta novidade no quesito compartilhamento de infraestrutura, embora haja amarras do ponto de vista das modelagens de negócio e da bitributação e restrições (ilegais) aos diferimentos decorrentes de cessão de meio de uso de rede.

A grande novidade que demanda avaliação tanto do mercado, quanto do órgão regulador, é a rede neutra móvel dedicada exclusivamente à oferta de espectro no atacado para outras empresas prestadoras de serviço.

A discussão desse tipo de operação passa pelo questionamento da licença SMP do operador neutro, desenhada em tese para o varejo, e do relacionamento com as outras operadoras, provedores regionais, titulares de licença SCM. Alcança, também, a discussão das obrigações de cobertura desenhadas pela política pública para o operador neutro adquirente do espectro.

Nesse sentido, agora é a hora dessa discussão: o leilão do 5G seria o palco ideal para permitir a oferta dos serviços por diferentes empresas, pulverizando o investimento em infraestrutura e espectro. Muito embora seja correta a afirmação de que não há hoje, na minuta do edital do 5G apresentada, nada que impeça o ingresso de um operador neutro que queira comprar frequência para vender capacidade a outros provedores regionais, apontamos um porém: a não destinação imediata das faixas ao SCM.

Nesse ponto, um cenário de lógica na entrada em operação dessas redes 5G: o adquirente (vencedor) poderia se fazer valer de um forte trabalho institucional junto às prefeituras das cidades atendidas, de modo a contribuir com um melhor alinhamento na escolha dos municípios cujas normas estejam aderentes à Lei de Antenas, conforme item 9.1.4 do Anexo IV da minuta do Edital. Todos ganham.

Depois, com base no item 7.2.2 do mesmo Anexo, os compromissos para a subfaixa de Radiofrequências de 3.300 MHz a 3.700 MHz poderiam ser atendidos a partir de infraestruturas ou recursos de terceiros.

A partir das duas previsões acima, o interesse amparado pelo edital se materializa e o operador neutro, adquirente da faixa, pode estruturar uma rede neutra e firmar contratos com provedores regionais MVNOs com atuação localizada, capazes de atender ao cliente diretamente na ponta.

Agora, em tese, se esse mesmo operador neutro, adquirente da frequência, quisesse prestar serviço de banda larga fixa pela rede 5G, através de contratos firmados com provedores regionais, em sua maioria titulares de licença SCM (e não SMP), não daria certo. Isso porque a minuta atual do edital condiciona a sua destinação às redes móveis do SMP.

Vejam que não basta que uso de radiofrequências atribuídas ao SMP possa ser associado, adicionalmente, ao SCM. A vinculação deveria ter sido feita no nascimento, garantindo assim a possibilidade de negócio da rede neutra enquanto rede fixa. Aqui, tratar-se-ia de proponente operador neutro cujo modelo de negócio e atuação exige a exploração de redes fixas para suportar o pagamento da infraestrutura, complementando, através de soluções FWA, as redes capilarizadas dos provedores regionais, convertendo a rede 5G nas ondas milimétricas de 26 GHz para dispositivos com conexão wifi.

Nesse sentido, haveria sim ajuste a ser feito com relação ao Edital do 5G, significativo o suficiente para desonerar, do ponto de vista regulatório, tanto a entrada em operação de uma PPP associada à uma operadora de rede neutra, quanto a própria possibilidade de um novo entrante, operador neutro, alinhado às parcerias com as redes capilarizadas dos provedores regionais.

Embora atenta às dificuldades atuais do compartilhamento de uso de espectro ou abertura de redes, como, por exemplo, as discriminações das MVNOs pelas operadoras de origem (detentoras da rede), ou os acordos de RANSharing, restritos apenas às grandes operadoras, ou, ainda, a ausência de compartilhamento de espectro ocioso por parte dos seus detentores, a Agência vem se mobilizando positivamente através da revisão ampla do mercado secundário e da autorização de uso de espectro em caráter secundário, buscando soluções mais flexíveis e seguras do ponto de vista regulatório para os envolvidos. Resta saber quando um ambiente de redes verdadeiramente neutro será uma realidade.

Câmara Abrint Mulher

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