Introdução
No início dos anos 2000, o setor de telecomunicações no Brasil prosperou, e investimentos maciços foram feitos na instalação e operação de redes de fibra óptica que se expandiram por diversas regiões do país. Esse período testemunhou a instalação de redes de grande extensão e elevada capacidade de transmissão, passando por diferentes caminhos, como rodovias, ferrovias e rotas submarinas, redes que hoje interligam cidades, estados e o país ao restante do mundo. A sociedade atual está cada vez mais conectada, e cada novo dispositivo que surge está conectado à Internet, transmitindo dados para a nuvem, possibilitando aos usuários controlar remotamente qualquer coisa de qualquer lugar. Para suprir essa demanda, as diversas empresas de telecomunicações, sejam elas grandes ou pequenas, buscam alternativas inovadoras para a expansão de suas redes e oferta dos novos serviços com um custo moderado.
Serviços e Inovação
Sem dúvidas, a inovação em produtos e serviços é muitas vezes a fonte mais importante de receita para o provedor de telecomunicações e um grande gerador de benefícios para os usuários (Fig. 1).
Um dos grandes desafios enfrentados pelas empresas de telecomunicações, em especial os diversos ISP’s espalhados por todo o país, está em disponibilizar uma infraestrutura de rede e de interconexão óptica robusta, que comporte as atividades do provedor com segurança, que assegure a disponibilidade dos serviços, mas que também atenda às necessidades dos usuários nas mais diferentes localidades.
Neste contexto, a dark fiber, ou fibra apagada, pode ser entendida como um serviço de transmissão de dados ponto a ponto, dedicado, e de alta capacidade, que pode ser usado por diferentes provedores de serviços de telecomunicações e, até mesmo, por empresas de diferentes segmentos, permitindo melhorias tecnológicas e, mais amplamente, uma maior capacidade de os provedores de telecomunicações inovarem na entrega de novos serviços e recursos de rede.
Dark Fiber
A expressão “dark fiber” diz respeito aos cabos de fibra óptica já instalados nas redes de comunicação atuais, mas que ainda não estão sendo utilizados pela operadora de telecomunicações na transmissão de dados. Ou seja, não há luz trafegando através dessa fibra, que ainda está “apagada” (Fig. 2).
Dark Fiber é uma modalidade de serviço que permite altas capacidades, tanto em termos de alcance quanto de largura de banda e uma solução de rede que possibilita às empresas, especialmente aos prestadores de serviços de telecomunicações, expandir sua infraestrutura, cobrindo mais regiões e clientes, de forma a privilegiar a eficiência e estratégia de operações, a partir de contratos de locação firmados com empresas detentoras de rede para esse fim.
Para, além de ser componente essencial de muitas redes de telecomunicação, a dark fiber é, também, essencial para suportar a prestação de novos e diferentes serviços em banda larga de forma rápida, sem depender de complexos projetos de construção de novas infraestruturas de rede.
A dark fiber pode oferecer aos ISP’s uma melhor margem para inovar e diferenciar seus serviços de rede, permitindo otimizar seus investimentos em equipamentos para acesso aos usuários, apoiando assim a disseminação de serviços baseados em fibra óptica.
Infraestrutura
O crescimento das comunicações através da Internet e as grandes demandas de novos serviços em nuvem através de Datacenters mudou a demanda por dark fiber. Hoje, os gigantes da Internet estão interessados principalmente na utilização dessa capacidade ociosa da rede óptica em todo o mundo.
Tradicionalmente, as redes de telecomunicações foram criadas e expandidas por meio da construção de uma infraestrutura que envolve a colocação de cabos enterrados (redes subterrâneas) ou sustentados em posteamentos (redes aéreas) ao longo de diferentes vias, ou mesmo submersos, um processo caro, demorado e forma disruptiva de estabelecer novas conexões (Fig. 3).
Do ponto de vista da infraestrutura, a existência da dark fiber é algo altamente estratégico, porque permite o atendimento de demandas futuras dos clientes e a redução de custos, porque não é preciso investir na construção de uma rede nova. Isso permite que os provedores de telecomunicações tenham maior controle e flexibilidade no desenvolvimento de novos projetos que lhes dá maior margem para desenvolver serviços novos e sob medida e/ou otimizar o design da rede existente.
Por esse motivo, muitas empresas de telecomunicações, no momento de projetar e construir sua infraestrutura de rede, adicionam um quantitativo de fibras ópticas a mais visando comportar essas futuras demandas de serviços, o que evita a instalação de novos cabos, algo que, além de gerar custos elevados, pode impactar na operação da rede existente.
Também é muito interessante para essa estratégia de contratação que as empresas de telecomunicações trabalharem em conjunto para estabelecer uma rede de interconexão comum, principalmente quando se trata de rotas de longa distância e em áreas rurais, onde os custos de construção normalmente são mais elevados.
Já os processos de detecção e reparo de falhas para dark fiber são diferentes daqueles processos e serviços de manutenção que normalmente ocorrem em redes próprias. Normalmente cabe ao detentor da rede o monitoramento, o diagnóstico, manutenção e o reparo em caso de falhas, e os custos dos serviços e dos processos que envolvem tais atividades na rede são previamente negociados em contrato.
Como Funciona?
A dark fiber é um capilar de fibra óptica conectando dois locais através equipamentos em cada uma de suas extremidades. Um equipamento dotado de um transmissor e um receptor óptico é usado para “iluminar” a fibra e transmitir informações entre os diferentes locais. Os componentes físicos dessa rede podem ser categorizados em componentes ativos (por exemplo, roteadores, switches, OLT’s etc.) e componentes passivos (por exemplo, dutos, caixas de emenda, suportes etc.) e a própria fibra óptica (Fig. 4).
O provedor de serviços que faz a contratação da dark fiber é o responsável por iluminar a fibra com seus próprios equipamentos, projetando a utilização da infraestrutura para suportar suas configurações, serviços, e aplicativos e escalar a rede para praticamente qualquer largura de banda.
Caso seja necessário atender diferentes locais geograficamente distribuídos, também é possível criar um anel com dark fiber. Este seria o melhor dos mundos, pois uma estrutura de rede óptica em anel oferece o máximo de disponibilidade e confiabilidade.
Quanto Custa?
Uma vantagem bastante significativa da dark fiber, principalmente em tempos difíceis como os atuais, é a redução de custos, uma vez que a empresa contratante irá utilizar fibras já instaladas. Isto permite uma redução direta nos custos de ativação dos serviços, já que não há necessidade de investimentos numa rede nova, por exemplo. Mas quanto custa?
É possível dividir as redes de fibra óptica comerciais em duas categorias para fins de precificação para dark fiber: rede de fibra de longa distância (WAN) e rede de fibra de área metropolitana (MAN). Os preços podem variar bastante dentro de cada categoria e, mesmo numa mesma região ou rota, podem variar entre os detentores de redes.
O preço da fibra é específico da rota e do local, pode ser ditado pela concorrência e, às vezes, utiliza critérios particulares, estabelecidos pelo detentor da rede. Em resumo, o preço da dark fiber é comumente estabelecido a partir:
- Disponibilidade por capilar, por quilometro, por um período definido;
- Grande variação entre mercados e entre operadoras no mesmo mercado;
- Específico da rota e do local e às vezes arbitrário;
- Área metropolitana versus longa distância (WAN x MAN);
- Rede existente versus nova construção versus extensão de rede;
- Contagem de fibras no cabo;
- Dificuldades de rota física;
- Taxas geralmente não disponíveis publicamente.
Normalmente, a empresa contratante fica responsável pelo custo incremental para conectar sua rede ao ponto de acesso mais próximo da dark fiber. Os custos de colocação, emenda, preparação e espaço em rack (se necessário) são geralmente avaliados com base no preço de locação da fibra. Algumas empresas também cobram uma taxa de ativação para cobrir os custos administrativos.
As empresas detentoras da dark fiber oferecem várias opções de contratação de rede incluindo termos de arrendamento por prazos de cinco, dez, ou mais anos. O contrato sempre deve apresentar uma descrição clara dos serviços oferecidos, incluindo características técnicas e processos operacionais do detentor da rede para solicitação de reparos e restabelecimento de serviços em casos de falhas. Por exemplo, espera-se que disponibilidade de uma rede de fibra óptica seja de, pelo menos, 99,98%. Ao optar pelo uso da dark fiber essa disponibilidade deve ser mantida. Condições especiais de acesso e serviços auxiliares e complementares associados ao acesso à rede, incluindo sistemas de suporte operacional e bases de dados etc., também podem constar do contrato de locação ou arrendamento.
A precificação comercial frequentemente se baseia em uma combinação dos fatores mencionados anteriormente. Por exemplo, concorrência para aquela rota, demanda do mercado na localidade e o custo de construção naquele local específico. Os preços para usos de rede sem fins lucrativos geralmente levam em consideração esses mesmos fatores, com pouca ou nenhuma margem de lucro. Algumas das redes de Instituições de Ensino Superior do país, por exemplo, baseiam sua precificação de fibra em um modelo de recuperação de custos de construção e operação.
É oportuno salientar que o maior desafio comercial talvez seja a forma de precificar o risco associado à possível incapacidade do contratante de se manter adimplente com suas obrigações financeiras nos termos firmados em contrato. De fato, o preço a ser praticado para a dark fiber será resultado de um equilíbrio, onde os valores são calculados considerando os encargos (impostos e taxas), a necessidade de o detentor da rede óptica atrair clientes para obter receita suficiente e fazer valer a pena o esforço da manutenção da infraestrutura e preservar os investimentos, ou seja, fazer a fibra se pagar e dar lucro aos investidores da rede.
Até o próximo artigo!
Autor: José Maurício sócio diretor da Ratio Consultoria e Professor Universitário