No competitivo mercado de provedores de internet e telecomunicações, diversos provedores buscam auxílio junto a consultorias atuantes no setor, para, dentre diversas demandas, fazer um planejamento tributário capaz de reduzir o recolhimento dos tributos decorrentes da atuação da empresa.
Sendo relevante destacar, nesta oportunidade, que além da perspectiva de melhora do resultado da empresa (lucratividade), da potencialização da geração de recursos para realização de investimentos em novos equipamentos, infraestrutura, rede, imóveis etc., o bom planejamento tributário tem como característica primordial a criação de uma estratégia jurídica sólida, segura e, portanto, pautada no princípio da legalidade.
Dito isto, e já pensando na implementação da estratégia tributária mais atrativa para os provedores de internet e telecomunicações, a principal providência a ser adotada pelos provedores é dar início à efetiva separação dos serviços de comunicação multimídia (SCM) versus serviços de valor adicionado (SVA).
Afinal, uma vez concretizada a efetiva separação entre os mencionados serviços (SCM x SVA), apenas a parcela dos serviços de comunicação multimídia será submetida à tributação do ICMS.
Nada obstante o raciocínio acima, tenho percebido que algumas consultorias quem atuam no setor passaram a sugerir aos seus clientes que incluam, em seus respectivos planos (ofertas COMBOS), a cobrança pela locação da ONU (Optical Network Unit) ou mesmo da ONT (Optical Network Terminal), como se a locação de tais equipamentos pudesse, de fato, ser compreendida como um serviço de valor adicionado (SVA).
Trata-se, na minha visão, de grave e desnecessário risco tributário que algumas empresas estão se submetendo. Isso porque, ao analisarmos o histórico de fiscalizações (sobretudo dos Fiscos estaduais), já é amplamente conhecido o entendimento do Fisco Estadual de que os equipamentos vinculados à prestação dos serviços de telecomunicações e disponibilizados aos assinantes devem também ser tributados a título de ICMS.
Para ilustrar este entendimento, me refiro ao trecho do Acórdão n.º 4034852-0, oriundo do Tribunal de Impostos e Taxas do Governo do Estado de São Paulo, que estabelece que “o codificador é parte indissociável da prestação onerosa do serviço de comunicação e, sem este equipamento, não haveria como prestar tal serviço. Desconsiderar que o valor do aluguel do codificador é componente da base de cálculo do ICMS configura redução indevida da base de cálculo do ICMS e restrição inadequada do alcance da Lei 6374/89, do RICMS/00 e da Lei Geral de Telecomunicações. O cliente não pode obter o serviço de comunicação, sem a contratação da locação do codificador”.
No mesmo sentido, me recordo do recente entendimento proferido pelo Conselho de Contribuintes de Minas Gerais e cristalizado no Acórdão nº 24.061/22 (publicado em 31.03.2022), segundo o qual a locação de equipamentos relacionados com a “infraestrutura de comunicação (…) caracteriza a prestação do serviço de telecomunicação, não podendo ser dividida em dois serviços independentes (um de comunicação e outro de locação)”.
Por seu turno, o Estado de Santa Catarina assentou seu entendimento através da Solução de Consulta nº 7/2018, no sentido de que, para que não se caracterize operação sujeita à incidência do ICMS, a empresa “deverá possibilitar ao cliente que usufrua do serviço de comunicação com equipamento padrão fornecido sem custos”.
Aguçando o debate, ainda podemos destacar a polêmica envolvida na cobrança pelo SETUP BOX utilizado pelas operadoras de TV por Assinatura. Isso porque, segundo o entendimento do Superior Tribunal de Justiça, apenas o Ponto Adicional admite a hipótese de cobrança por locação, sendo vedada, portanto, a cobrança de locação pelo SETUP BOX principal.
Para ilustrar a questão, trago a conhecimento o trecho da decisão do AgInt no REsp n. 1.867.627/MG, segundo o qual “não se afigura abusiva a percepção por aluguel de equipamentos adicionais de transmissão ou reprodução do sinal de TV, pois, por serem opcionais, permitem cobrança mensal em número correspondente ao de sua disponibilização, visto acarretarem custos para o fornecedor e vantagens para o consumidor.”
Como se percebe, o principal argumento utilizado pelos Fiscos estaduais é que, por tratar-se de equipamento imprescindível para a regular prestação dos serviços de comunicação multimídia (SCM), sem o qual, vale dizer, sequer seria possível estabelecer a conexão primária dos serviços de comunicação perante o domicílio do assinante, os valores cobrados à título de locação de modems (p. ex. ONU e ONT) devem, para todos os efeitos, ser incluídos na base de cálculo do ICMS.
Ilustrando melhor os riscos que esta estratégia atrai para as empresas, trago a conhecimento de todos vocês as perguntas direcionadas por um Auditor Fiscal, no curso de uma fiscalização tributária, para um provedor que há pouco tempo procurou o auxílio da Silva Vitor, Faria & Ribeiro Advogados:
a) Há necessidade do usuário/assinante fazer uso de equipamentos específicos para usufruir dos serviços prestados?;
b) a empresa promove a locação destes equipamentos?;
c) caso positivo, tais equipamentos fazem parte da prestação dos serviços, ou seja, sem tais equipamento não há condições de prestação dos serviços?;
d) há possibilidade do cliente fazer assinatura do SCM sem aderir ao contrato de aluguel destes equipamentos?;
e) algum assinante dos serviços de comunicação realizou a locação de equipamentos junto a outro(s) fornecedor(es)?
Vejam, portanto, o claro viés assumido pelo Auditor Fiscal que formulou os questionamentos acima, pautado, à toda evidência, no intuito de submeter, à título de ICMS, a integralidade dos valores obtidos com a locação de equipamentos, sobretudo os modens (ONU e ONT).
Para clareza, o risco tributário apresentado neste artigo está realizado à cobrança, a título de locação, de equipamentos imprescindíveis para o estabelecimento da conexão primária, como ONU e ONT, tal como já decidido, por analogia, em relação ao SETUP Box Principal.
Todavia, em relação a equipamentos que proporcionem uma funcionalidade adicional, como um roteador separado da ONU (que proporciona, por exemplo, uma conexão wifi, suplementar à conexão física), entendo por sua vez que existem fundamentos jurídicos bastantes para sustentar a não incidência do ICMS.
Pois bem! Uma vez demonstrados os riscos inerentes à estratégia de locação de equipamentos vinculados à prestação dos serviços de telecomunicações e fundamentos para o estabelecimento da conexão primária, como por exemplo a ONU e ONT, cabe a mim sugerir a vocês uma breve reflexão: Vale a pena apostar em uma estratégia de economia tributária que não inspira segurança para o futuro da sua empresa?
A minha resposta é bastante direta: é claro que não! Como disse acima, o caminho para redução da carga tributária da sua empresa é a implementação de um bom planejamento tributário, pautado em uma estratégia jurídica sólida, em plena conformidade com a legislação vigente.
Paulo Vitor
Advogado e Consultor Jurídico. Sócio-Fundador da Silva Vitor, Faria & Ribeiro Sociedade de Advogados