O Novo Mercado dos ISPs
Enviado em 30.03.2023

O Novo Mercado dos ISPs

O ano de 2022 marcou a mudança do mercado de banda larga no país. Quando estas linhas foram traçadas, o número de conexões […]

O ano de 2022 marcou a mudança do mercado de banda larga no país. Quando estas linhas foram traçadas, o número de conexões ativas em dezembro ainda não era conhecido mas, a julgar pelo comportamento errático observado mês a mês, é bem provável que o crescimento não tenha chegado sequer à metade dos 14% registrados no ano anterior.

Como foram os ISPs que impulsionaram a Internet rápida no país nos últimos anos, surge a pergunta: teria passado a maré que impulsionou o segmento? A resposta é NÃO.


No final de 2019, ano que antecedeu a pandemia e o consecutivo buuum da banda larga no país, havia 32,9 milhões de acessos ativos. Em setembro, eram 42,8 milhões. O serviço estava disponível, segundo o IBGE, em 90% das residências brasileiras. Sobre essa nova base, não há como manter o ritmo de expansão apenas com a oferta de novas conexões. Estas, porém, ainda possibilitam margens significativas.


Entre janeiro e agosto de 2022 – quando este artigo foi redigido, era o dado mais atual não sujeito à revisão pela Anatel –, foram registradas 2,5 milhões de novas conexões banda larga, uma alta de 6% ante o fechamento de dezembro de 2021. Se é pouco perante o que o segmento exibiu nos anos anteriores, é um dos melhores desempenhos observados na economia brasileira no período.


Menor mas ainda relevante, o potencial de crescimento de conexões permanece concentrado nos ISPs, até porque a oferta de banda larga nas áreas atendidas pelas operadoras praticamente atingiu o teto. Conforme a pesquisa Fronteiras da Inclusão Digital, coordenada por Cetic.br, Nic.br, Programa de Acesso Digital da Embaixada Britânica e Anatel, 79% da população dos grandes centros, áreas atendidas pelas teles, dispõem do serviço. Em cidades com até 20 mil habitantes, o percentual cai para 66%. Nestas localidades está a maior parte das 7,28 milhões de famílias que, segundo o IBGE, não tinham acesso à Internet em 2021.


Este quadro bastaria para que os ISPs continuassem sob os holofotes de investidores, dando sequência às transformações que o segmento vive há anos, como a onda de M&As que não dá sinais de desaceleração. A competição continuará crescente. Não há mais espaço para novos entrantes e a disputa pelos mesmos consumidores passa pela oferta de vantagens, como instalações gratuitas e brindes, e pela excelência na prestação dos serviços.


Com empresas capitalizadas e com maior porte, a disputa por mercado se dará de outra forma, particularmente no aumento das velocidades fornecidas e melhoria dos pacotes de serviços que a banda larga viabiliza, um leque amplo.
Dentre as inúmeras atividades que pandemia levou para o mundo virtual, o teletrabalho é das que mais se consolidaram. A possibilidade de se trabalhar em qualquer local acabou por acelerar a descentralização econômica que estava em curso havia anos.


Muitos puderam deixar as grandes cidades e estabelecer moradia no campo ou no litoral, áreas atendidas apenas por PPPs. Essas pessoas, quase todas com alto poder aquisitivo, além do consumo de bens e serviços, levaram consigo ou criaram negócios nas localidades onde passaram a residir. Essa migração elevou a demanda por soluções voltadas ao público corporativo, como armazenamento em nuvem, e-mail e afins.


Ao mesmo tempo, mas num ritmo mais intenso, cresce o consumo de jogos online e, principalmente, de streaming de vídeo, usos que consomem maior banda, o que aumenta o interesse de clientes de PPPs por velocidades maiores de conexão. Já serviços como o acesso a conteúdos audiovisuais configuram já oferta de boa parte dos provedores, ávidos por conquistar ou fidelizar clientes. Mais que a ampliação das carteiras, o aumento do ticket médio passa a ser o principal objetivo dos ISPs.


Dispor desses serviços, no entanto, implica na adoção de cuidados que vão muito além da escolha de fornecedores e dos pacotes mais adequados ao público final. A falta de zelo na viabilização dessas ofertas pode transformar o aumento de receita no curto prazo em passivos e outros problemas no futuro.


A simples comercialização desses serviços geralmente não implica em grandes investimentos, já que se dá a partir de parcerias com fornecedores. Os ISPs, que basicamente comercializam essas soluções, também não precisam de novas licenças. Ocorre que a incorporação de novas ofertas demanda tanta atenção quanto a uma série de ações necessárias que, se mal conduzidas, expõem os ISPs a riscos.


Após a negociação e acerto com os fornecedores, deve-se formular a política do serviço. Haverá necessidade de uso de aparelho – por exemplo, na Box TV –? Se houver, este será vendido ou fornecido em comodato? A que custo? Outro ponto é a forma como esse tipo de comercialização será diferenciado no faturamento e como ele será configurado para fins de tributação.


Em geral, esses serviços são caracterizados como SVA (Serviço de Valor Adicionado). A grosso modo, a classificação se aplica a algo que agrega valor ao acesso à Internet sem viabilizá-lo. Porém, há cuidados para que se evite futuros questionamentos por parte do Fisco.


Caso notório é o streaming. Geralmente, é configurado como um SVA, classificação que tem como principal tributo o ISS, com alíquotas que não chegam a 5%. Porém, algumas Secretarias da Fazenda tentam caracterizá-lo como SeAC (Serviço de Acesso Condicionado), sobre o qual há incidência de ICMS, que tem hoje alíquotas de 17% e 18%. Caso seja comprovada artificialidade na configuração do serviço como SVA, o ISP pode sofrer cobrança retroativa.


A adoção de modelos de contratos adequados elimina esse risco. Em norma, a Anatel classifica SeAC de Comunicação Audiovisual como serviços compostos pelas atividades de (I), produção, (II) programação, (III) empacotamento e (IV) distribuição. A formalização contratual de que o ISP não responde pelas três primeiras caracteriza o streaming como um SVA.


A formalização é necessária sempre que um provedor ofertar novos serviços. Seja em novos contratos ou em aditivos aos já existentes, cada solução ou mudança no que se fornece ao cliente deve ser registrada. Isso implica na utilização de modelos de contrato ou aditivos corretos. Com diversas variáveis a serem observadas, os ISPs devem estar atentos quando forem escolher parceiros que os orientarão nos aspectos regulatórios de seus negócios.

Fábio Vianna Coelho, Sócio da VianaTel e da RadiusNet, especializadas, respectivamente, em regularização de provedores de Internet e softwares de gestão para ISPs. contato@vianatel.com.br

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